Residencial com 821 lotes é irregular, diz Ministério Público

 

Maria José Sá  ( Materia toda responsabilidade do jornal ''O HOJE") 04/02/2010
Inúmeras irregularidades no loteamento “Residencial João Paulo II”, na zona Norte de Goiânia, levaram o promotor de Justiça Maurício Nardini a propor, ontem, ação civil pública contra a Sociedade Habitacional Comunitária (SHC); o Estado de Goiás, a Agência Goiana de Habitação (Agehab) e o Município de Goiânia. Foram acionados também o ex-presidente da Agehab, Álvaro Lourenço; o atual presidente da Secretaria Municipal de Planejamento e Urbanismo (Seplam), Luiz Alberto de Oliveira, e seu ex-dirigente, Francisco Vale Júnior; além do vereador Maurício Beraldo. O MP pede a condenação deles por ato de improbidade administrativa.

Nardini argumenta que o Residencial João Paulo II foi implantado clandestinamente, à revelia da administração municipal e possui 821 lotes. “O loteamento foi aprovado por decreto municipal de 23 de agosto de 2007, mas não foi expedida licença ambiental pela Agência Municipal do Meio Ambiente – AMMA, o que é uma irregularidade.”

O promotor prossegue: “a Agehab não finalizou o processo de registro do loteamento, conforme informações prestadas pela sociedade de economia mista e pelo Cartório de Registro de Imóveis, sob o argumento de que, em conjunto com a Seplam, seriam reanalisados os projetos urbanísticos, de forma a potencializar a utilização das áreas públicas.”

Maurício Nardini afirma que, apesar da irregularidade do loteamento, a Agehab liberou 200 cheques-moradia para a SHC, no valor total de R$ 720 mil. O promotor diz que o antigo presidente da Agehab, Álvaro César Lourenço, alegou ao MP que não tem conhecimento sobre o projeto habitacional do João Paulo II. “Na gestão dele foram emitidos 200 cheques moradia a supostos beneficiários de lotes no Residencial João Paulo II, conforme lista fornecida pela própria Agehab.”

Beneficiários alegam que o valor montante do cheque-moradia foi repassado diretamente para a SHC. “Eles receberam o valor e se encarregaram de comprar o material de construção, mas fizeram uma reunião e disseram que o dinheiro não dava. Então, exigiram mais R$ 2 mil de cada beneficiário, para a construção do alicerce. Somos pobres, parcelamos na SHC e pagamos com muita dificuldade, pois queremos ter a nossa casa”, diz um deles, que não quis se identificar.

O promotor questiona: “Se a construção aconteceu em regime de mutirão ou pelo próprio adquirente, qual seria então a destinação dos valores entregues referentes ao cheque moradia? Apenas para a compra dos materiais de construção, que excluíram, inclusive, os alicerces?”

A atual presidente da Agehab, Silmara Vieira, explica que R$ 5 mil são insuficientes para a construção de uma casa de 40 metros quadrados. “Se o valor do cheque-moradia for insuficiente, a associação pode pedir um complemento para o beneficiário, desde que isso fique bem claro, tem que ser um processo transparente, com rigorosa prestação de contas e comum acordo.” Silmara diz que está no gabinete civil o projeto de lei que prevê a ampliação do valor do cheque-moradia para R$ 10 mil, cuja votação na Assembléia Legislativa deverá ser em março.

A presidente da Agência Goiana de Habitação se diz ciente dos erros da administração anterior e se dispôs a colaborar com a resolução do caso, para que a comunidade do Residencial João Paulo II não seja penalizada por erros administrativos. “Compreendo o papel do Ministério Público e considero justa a ação. A Agehab está tomando as providências para a regularização fundiária do loteamento Residencial João Paulo II, contemplando todas as exigências urbanísticas, arquitetônicas e ambientais.”


Presidente da SHC não se pronuncia
Beneficiários do Residencial João Paulo II alegam que são intimidados por membros da Sociedade Habitacional Comunitária. No setor impera a lei do silêncio e os poucos que falam imploram por não serem identificados, temendo retaliações.

Eles dizem que a construção das casas é feita em mutirões aos finais de semana. “Todo mundo trabalha sábado e domingo, inclusive mulheres e idosos. O serviço não é remunerado, mas quem falta tem que pagar multa de R$ 50 por dia. Tem gente que não pode vir porque passou a trabalhar no sábado, mesmo assim corre a multa, que vai acumulando e os fiscais da SHC cobrando sem parar. Os fiscais da SHC ainda ficam em cima, mandando a gente andar mais rápido com o serviço e fazendo ameaças”, reclama um pedreiro que não quis se identificar.

A presidente da SHC não quis se pronunciar sobre as denúncias dos beneficiários do Residencial João Paulo II, e o vice-presidente, André Luiz, disse que nos atenderia por telefone, no entanto, até o fechamento desta edição, o celular dele estava desligado. A assessoria do vereador Maurício Beraldo disse que ele viajou para a fazenda dele, em Niquelândia, onde está incomunicável, “mas retorna sexta-feira, quando estará disponível para esclarecer qualquer dúvida.”


Providências
Com a ação, o Ministério Público requer que o Estado e a Agehab sejam obrigados a fazer o licenciamento ambiental do loteamento e as alterações urbanísticas exigidas pelos órgãos municipais e que solicitem à prefeitura a consequente reedição do decreto de aprovação. A administração estadual ainda deverá fazer o registro do loteamento em cartório, bem como executar a recuperação das Áreas de Preservação Permanente (APPs) existentes no local e implantar a infraestrutura do residencial.

O MP quer que a administração municipal seja compelida a notificar a Agehab para que o loteador assuma as obrigações exigidas pela legislação e, em caso de desatendimento, que promova a regularização fundiária do loteamento. Também deverá promover a recuperação das APPs e, em consórcio com o Estado, providenciar a infraestrutura exigida.

Em relação à SHC, o Ministério Público pede que a entidade apresente em juízo a lista das famílias contempladas no projeto, forneça a relação dos lotes com os respectivos beneficiários, faça a prestação de contas da associação, com dados dos cheques-moradias e contribuições recebidas e notas fiscais dos materiais adquiridos para o empreendimento. O MP quer que a entidade também deixe de promover qualquer ato de construção civil no loteamento até o fim do processo judicial. Para isso, ela deverá declarar a suspensão de suas atividades para resguardar o interesse e direito dos associados.

 Maurício Nardini esclarece que, seu objetivo é que, tão logo sejam corrigidas as irregularidades, as obras sejam retomadas e concluídas, para que a comunidade não sofra prejuízo. (M.J.S.)

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